“Enquanto a sociedade feliz não chega, que haja pelo menos fragmentos de um futuro em que a alegria é servida como sacramento, para que as crianças aprendam que o mundo pode ser diferente. Que a escola, ela mesma, seja um fragmento do futuro...” (Rubem Alves)





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O real problema da educação paulista


Uma coisa que tem chamado muito a minha atenção nos últimos meses é a critica à educação brasileira ser centralizada na qualidade dos professores. Essa crítica vai desde a boa intenção dos professores até sua formação universitária, porém a realidade é bem diferente da fala teórica e utópica.
Quando digo teórica, não me refiro à teoria de maneira acadêmica que exige pesquisa, citações de autoridades no assunto e compromisso com a realidade. Pelo contrário, chamo teórica num sentido menos acadêmico, teoria como simplesmente ideia desvinculada da realidade, uma opinião infundada.
O grande desafio do magistério paulista não está na formação dos professores (é claro que existem casos e casos), já que a maioria dos professores que conheci, nesses quatro anos de magistério e treze escolas pelas quais passei, são pessoas de nível cultural elevado, que apreciam os estudos e buscam sempre melhorar como profissionais.
Também não podemos culpar as faculdades em cem por cento pelos problemas educacionais, até por que o bom professor não depende apenas do diploma, e sim procura progredir sempre em sua formação. Não se fixa em um método pedagógico, mas aprende todos e sempre adéqua sua metodologia às necessidades de seus alunos, observadas continuamente de maneira diagnóstica.
O grande problema da educação paulista é a indisciplina dos alunos em sala de aula. Uma das coisas mais básicas em qualquer situação em que se tem um professor, é entender que a explicação deve ser ouvida. Pois sem esta é muito difícil, talvez impossível, sequer o aluno saber o que está fazendo na escola.
Isso independe do método utilizado, simplesmente não há o diálogo. Alunos entram em sala de aula brincando e ignoram tudo o que o professor tem a dizer. Ficam o tempo inteiro falando alto e quando o professor pede para que eles deixem para conversar em outro momento, ou é ignorado ou desafiado.
É claro que não são todos os alunos que tem essa postura, geralmente é uma minoria em sala de aula que já desestabiliza e atrapalha todo o trabalho. Mas os números variam muito, às vezes temos turmas em que a maioria do alunos não quer prestar atenção na aula, muito menos fazer as atividades propostas.
Um fator bastante relevante é a diferença que existe no comportamento dos alunos de escola para escola. Em todas elas o professor deve saber conquistar o respeito e a atenção dos alunos, e cada um tem sua maneira de trabalhar. Porém temos “escolas e escolas”.
As escolas mais difíceis de trabalhar são as que ficam em regiões periféricas. São alunos que tem histórias de vida muito tristes. Pais separados, pai na cadeia, violência doméstica, suicídio na família, desprezo dos pais, falta de planejamento familiar, nenhum incentivo para estudar a não ser o bolsa família, uso de álcool e drogas ilícitas durante a adolescência, comportamento sexual precoce, etc.
Nas reuniões de pais, aparecem geralmente apenas os pais dos bons alunos (não é difícil deduzir por que são bons alunos), os que mais precisam de atenção dos pais simplesmente não a tem.

Mas aí surge a grande questão, “como o aluno se sentirá motivado a estudar se não há incentivo?”
Como professor procuro conscientizar os meus alunos da importância da escola em suas vidas e tento ao máximo fazê-los gostar da matéria para que haja alguma motivação. Mas isso nem sempre  é o suficiente,  os menores (quinta à sétima série) não entendem esse tipo de diálogo, acredito que alguns do ensino médio também não, ou porque sua capacidade de compreensão já está comprometida pelos muitos anos perdidos, ou não quer encarar a realidade.
Muitos alunos veem a escola como  o lugar que eles tem para extravasar suas mágoas e brincar o máximo possível com seus colegas sabendo que tem em casa uma realidade difícil para encarar. É claro que muitas vezes isso acontece de forma inconsciente e os coitados vão sendo levados pela vida.
Uma rigidez disciplinar em sala de aula aliada ao bom senso pode ajudar muito no trabalho do professor, mas com a aprovação automática e a falta de apoio que a escola tem dos pais tudo fica muito difícil.
O que mais me admira é ver que com tudo isso ainda há alunos que aprendem e professores que conseguem ensinar algo, até mesmo incentivar esses alunos a progredir na vida e enfrentar as dificuldades para encontrar seu próprio caminho.
Por isso não adianta o governo de São Paulo achar que com esses cursos básicos que eles proporcionam e trazem apenas conteúdos que todo professor conhece (geralmente nos primeiros semestres da faculdade) está melhorando a educação. O problema é muito mais sério. É uma questão de estrutura familiar, são pais com histórias complicadas de vida e infelizmente isso reflete na conduta escolar dos filhos.

Meu objetivo com esse simples texto não é demonizar pais ou alunos. Quero apenas levantar essa reflexão sobre o real problema da educação brasileira, especialmente da educação paulista. Para que não nos apeguemos ao mito de que uma boa educação depende apenas dos professores.